30.11.12

Desmundo


Imagem: desconhecido
Poesia: Danízio Dornelles
Comer o pão
que o diabo amassou
no leite derramado
por séculos a fio...

Diabo?

O mal traz a cruz,
sangra a quem convém,
mata em nome do bem...

Acaso alguém

26.11.12

Pôr-do-sol *

Poesia/Imagem: Danízio Dornelles


Carvão negro e alma clara,
Orvalho e fogo da noite,
As pétalas contra o vento
(o vento da eternidade),
Descabelando minha alma
No pôr-de-sol dos cabelos,
Que resguardam meus silêncios
Caminho, sonho e verdade!

Calidez da tua pele
(mistérios na flor do nada),
Peregrinos mar adentro,
Amor à luz do farol,
Remanescentes do tempo,
Razão que ninguém compreende:
No beijo, o brilho da lua,
Nos cabelos, pôr-de-sol...

Rutilante melodia,
Mel da terra, água e madeira...
E a antiga geada dos olhos
Foi cascata sobre a face,
Orquestra de um canto puro
(que um dia já foi cantado),
Que adormeceu noutro tempo
E a cada vida renasce!

Pôr do sol, brilho da lua
E as velhas linhas do tempo...
Silente voz que só ouve
Quem tem ouvidos além:
O beijo é a estrela desnuda
(perdida num outro espaço),
Caminho predestinado
Na profecia de alguém!

Antigas almas sonoras
Na poeira dos descaminhos,
Encontrei-me além-mar
(esculpindo o arrebol):
No corpo a face da lua,
Nos olhos, brilho da noite,
No silêncio nossas almas,
Nos cabelos, pôr-de-sol...

*pôr-do-sol ou pôr do sol? (http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php?id=2845)

23.11.12

Os olhos de Korda repousam sobre Cuba

Poesia/Imagem: Danízio Dornelles
A Alberto Korda, fotógrafo cubano. Autor da imagem
mais reproduzida no século XX, "el Che"

Insurgente,
um raio penetra a escuridão
e tudo se faz luz

Somos todos pedra,
por onde a utopia esculpe
uma vertigem de luta

Os olhos de Korda
repousam sobre Cuba,
delineiam o novo matiz,
forjam um sentido de povo:

-Nasce uma vertigem de luta
nos olhos de Korda...

Há uma menina
com morenos traços
diante da lente,
corroída madeira
como prolongamento dos braços,
inocentes sonhos,
esvoaçando a face triste,
como se a dor fosse, assim,
uma irmã mais velha.

Os olhos de Korda
repousam sobre Cuba...
Insurgente, um raio lhe desperta
uma utopia lhe governa,

Korda não mais adormecerá.

21.11.12

Rebeldia

Imagem: França, maio de 1968
Poesia: Danízio Dornelles
Mulher que despertas
A lua consciente
No vermelho do sol
Te chamo amanhã
Nos olhos sedentos
Nas veias latentes
O sonho insistente
Te fez nossa irmã

Carregas no ventre
A semente mais pura
A flor estridente,
O mistério, a razão
O canto comum
Pra calar a tortura
A noite escura
Pra revolução

És mãe das enxadas
Esperança liberta
Forjaste a utopia
Pra a morte do medo
O fruto do sangue
Das veias abertas
Pra hora mais certa
Guardaste o segredo

Temor dos tiranos
Senhores do luto
Acalanto da vida
Fecunda a verdade
Clarim dos humildes
A cada disputa
Bandeira de luta
Mulher-liberdade

20.11.12

Caderno Azul

Imagem: desconhecido
Poesia: Danízio Dornelles

Um amigo com um caderno azul
Procura por si
(ou sou eu que ando perdido?)
Procura entre os espinhos
Que, no pátio, eternamente se multiplicam,
Procura nos olhos da menina
(que, escondida no quarto,
busca o refúgio do mundo)...

Um amigo com um caderno azul
Traz calma nas palavras
E tormentas no abismo secreto,
Que é seu interior;
Notas tristes no violão
Para encantar 
Os que já perderam o encanto...

Um amigo com um caderno azul
Procura uma gota de mar,
Mar de Neruda!
Mar de Alfonsyna!
Mar de Vinícius!..
Compõe devaneios reais
Em mundos imaginários,
Empresta suas rosas negras
Para que alguém
Escreva um poema triste;

Um caderno azul e um amigo...
Ambos, por vezes adormecidos,
Em represada fúria da noite interior,
Estão – talvez – lado a lado.
Ambos a procura de si
(ou sou eu que ando perdido?)

17.11.12

Paola

Imagem: desconhecido
Poesia: Danízio Dornelles
Uma lua silenciosa adormece sobre ti
Buscando paz em tua pele temporal
E nos olhos que margeiam o encanto
Sucumbe o pranto de uma noite lacrimal

Noturnas aves sangram o céu em desalinho
Voejam loucas num inverso pesadelo
Rasgam as nuvens e do ar fazem o ninho
Enfeitiçadas pela noite dos cabelos

E cada estrela no teu corpo é madrugada
No estranho toque de uma brisa em agonia
Como Neruda, uma canção desesperada

Bebe em tua boca a espera de outro dia
Quando adormece cada sonho machucado
Desperta a vida nos teus lábios, poesia

Des(a)tino

Imagem: Desconhecido
Poesia: Danízio Dornelles
Coisa da pele
Que sacia,
-Alquimia!
Conduz o delírio
Da loucura:
-Me procura!
Quando o avesso
For metade,
-Me invade!
Quando o céu
For um tormento,
-Desalento...
Sinal pra possuir
A tua chama,
-Que inflama,
O corpo insone
Acorrentado,
-No pecado,
De querer mais
A tua pele,
-Que repele,
Cada vazio
Que adormece,
-Então esquece!
Finge que a carne
Não domina,
-Me ensina,
A cantiga de conter
A dissonância
-Na distância...
O desatino febril
Por onde for:
-Teu amor!..